Por muitos séculos a mulher teve seu corpo objetificado, subjugado, dominado pela sociedade patriarcal. O corpo da mulher dominado em sua sexualidade, parto e conceitos de feminilidade faz parte de todo um discurso religioso, social e político. O despertar da mulher para uma imersão na sociedade e no mercado de trabalho, e principalmente para dominar seu próprio corpo e sexualidade torna-se um perigo tanto para a perda do privilégio masculino como para a produtividade de mão de obra para o mercado de trabalho.
Desde o século IV que o poder eclesial tentou persistentemente colocar regras no exercício da sexualidade. A santidade se constituía o sinônimo de evitar sexo com as mulheres. O poder patriarcal tentou, dessa maneira, retirar as mulheres dos rituais sagrados e lhes roubar de sua erotização. A partir do século VII manuais práticos para confessores foram distribuídos para regular a prática do sexo entre os casais. Instruções de posições (que era somente uma: o homem por cima da mulher), dias e estabelecimento de datas específicas para a prática sexual, tornava quase impossível ter relações sexuais, mesmo casados. No século XII os manuais rezavam que os casados deviam evitar o sexo durante três períodos da quaresma associados com a Páscoa, com o Pentecostes e com o Natal, em qualquer domingo do ano, nos dias festivos que antecediam o recebimento da comunhão, nas noites de bodas, durante a menstruação, durante a gravidez, durante a amamentação, enfim, poucos dias restavam para o casal exercer sua sexualidade.
No Concílio de Latrão em 1179, os ataques contra a homossexualidade e ao sexo não procriador se intensificaram e a condenação à homossexualidade foi instaurada. Finalmente a sexualidade torna-se politizada. A mulher que ousasse formar opinião, fazer remédios caseiros ou se rebelar contra qualquer regra imposta pelos homens, era considerada bruxa e enviada às fogueiras. Segundo Foucault, a confissão instituída no século XII tinha como objetivo descobrir as intimidades dos indivíduos e principalmente dominar suas almas e seus pensamentos mais secretos. Qualquer mulher que declarasse ter tido prazer com seu marido na cama, era imediatamente queimada na fogueira.
Mas, o que isto tem a ver com os dias atuais? Afinal, estamos no século XXI. A mulher conseguiu sua emancipação com conhecimento, o poder de aprender a ler e a escrever, a frequentar universidades, a exercer qualquer profissão. Se temos a pílula anticoncepcional, preservativos e o poder de não querer ser mãe, o que a prende?
Ledo engano, a igreja tornou a sexualidade uma questão política. A igreja consegue perseguir as mulheres e a liberdade dos seus corpos com leis, regras e um falso moralismo. Temos políticos que elevam a ministras da família mulheres antifeministas. Por que tanto medo do feminismo? Hoje as mulheres não são queimadas numa fogueira física, mas com versículos bíblicos e discursos sobre “feminilidade bíblica”. Seus corpos continuam presos a dogmas e mitos. O “instinto maternal”, o sexo proibido, o prazer submetido às correntes da religião.
Desde a década de 1930, com as sufragistas, as mulheres lutam pelo direito de votar (exercer sua cidadania plena), igualdade salarial, inserção no mercado de trabalho, ingresso em universidades (quaisquer que fossem). Na década de 1970 iniciou-se a luta pelo sexo sem procriação, e o direito de não mais ser considerada cidadã complementar do sexo masculino e nem cidadã de segunda classe. Abaixo as ideias de mulher ser emotiva e o homem racional. Abaixo as ideias de mulher não ter senso de direção e o homem ser um bom motorista. Abaixo os preconceitos e os conceitos de que mulher só serve para ter sexo. A mulher quer ser validada por quem ela é e pode fazer, e ela pode tudo!