“Esperanças pulverizadas”, por Priscilla dos Reis Ribeiro

Sábado da Quaresma, vigília pascal, tempo de esperanças adormecidas, de noite escura na alma, de silêncios. Quando será que os discípulos e discípulas de Jesus se questionaram diante da dura realidade da morte? Devem ter perguntado, aos seus próprios corações, se tudo de deslumbrante que haviam visto Ele fazer e aprendido em suas instigantes conversas era realmente verdadeiro.

Assistir ao espetáculo escabroso de violência e tortura que foi imposta ao amigo que os mergulhou em três anos de uma vida totalmente outra, certamente os deixou atônitos. Diante da morte que nos é tão antinatural por sermos seres da eternidade, as perguntas incômodas veem, e é esperado que isso aconteça.

Na recente plantação de sonhos que o Messias adubou em seus corações, a incerteza de não tê-lo ao lado na jornada fazia o brilho das possibilidades desvanecer. Como seguir sem Ele? Como voltar para casa, se tudo que tínhamos e éramos se desfez como fumaça diante do horizonte revolucionário que Ele nos apresentou? A liberdade que haviam experimentado deixara um gosto bom mas agora seguiam os questionamentos que hoje nos chegam através dos Racionais: “o que fazer quando a fortaleza tremeu / E quase tudo ao seu redor / Melhor, se corrompeu?” Ver suas esperanças pulverizadas dessa maneira é um golpe muito duro.

Noite longa! Angústia sem fim! A escuridão da crucificação era maior do lado de dentro daquela gente que estava se acostumando a se alimentar de boniteza e companheirismo. Pense comigo: aqueles homens e mulheres que no cotidiano ordinário de subjugados (sabemos o que é isso em nossa memória ancestral pois já fomos colônia um dia e os efeitos das múltiplas violências, nos corpos e nas subjetividades, ainda se veem) tiveram a chance de reverdecer seus afetos e reconstruir suas identidades. Porém… o corte foi brutal.

Por que tamanho horror? Por que o trataram assim se ele nenhum mal fez? Que coisa desproporcional! Onde estão os covardes agora, os religiosos hipócritas, gente que por toda a vida se denominou exemplar? E o que será feito de nós? Temos razões para continuarmos juntos? Essas e outras perguntas são feitas por nós também, diante das incógnitas que a realidade nos impõe.

O sábado de dúvidas insiste em nos assombrar em momentos distintos da vida, quando a espera parece interminável, quando as razões para continuar não se apresentam com a força que precisariam ter e a gente boia à deriva, num mar de incertezas.

Compreender o processo nem sempre é fácil; por mais que Ele tenha dado o spoiler do que iria ocorrer, suas palavras se perderam nas brumas da memória porque afinal de contas, voltar a viver é um tanto absurdo, não é mesmo? Seguir a sugestão do Drexler e “amar a trama mais do que o desenlace” é só para os fortes ou os que não são ansiosos como eu sou. Sem poder olhar além da curva, desanimamos. Afinal de contas quem garante que nosso coração não vai se cansar de esperar, que as decepções valerão a pena e que nossos desejos realizados serão ainda melhores do que aqueles que conseguimos sonhar? Ninguém!

O sábado da páscoa grita que se perder em meio as incertezas é possível, mesmo tendo caminhado com o Cristo, e tá tudo bem. TÁ TUDO BEM. É humano, faz parte de nós ter dúvidas porque a fé é aquele restinho, aquela poeira que sobra depois que tudo foi demolido. Só que a história não acaba neste dia sombrio… domingo vem!

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